quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Saudades

O lugar estava lotado e eu sumia dentro da multidão, passando despercebida logo quando eu não queria. Isso soava irônico para mim. Eu normalmente gostada da invisibilidade, já que eu chamava atenção só pelo jeito de falar. Chegava a ser irritante não chamar a atenção logo hoje que eu queria. Ansiosamente olhava para o relógio para ter certeza de que não estava atrasada. Mais nervosa por dentro que por fora, meus tiques nervosos apareciam de vez em quando apenas para afirmar o quanto eu estava ansiosa. Coisa tão típica minha.
- Acalme-se por favor, você está me dando nos nervos sabe? - Uma voz falou perto de mim e eu sorri nervosa ao virar a cabeça em direção ao dono. Por um segundo, eu tinha esquecido que meu amigo estava aqui comigo.
- Não consigo evitar. É mais forte que eu - Falo com um sorriso de desculpas, sabendo qual seria sua próxima reação. Ele revirou os olhos, deu uma bufada e fez um bico com os lábios.
- Nunca vi você nervosa nem em dia de prova. Aí hoje você parece que vai explodir de tanta inquietação.
Eu ri comigo mesma e dei a língua para ele. Eu sabia que ele estava certo. Mas ninguém poderia me culpar por estar daquele jeito. Provas, entrevistas de emprego, essas coisas são corriqueiras para mim. Não há porque ficar tão nervosa em relação a isso. Agora, quando eu encaro a situação inusitada que eu estava agora, é óbvio que eu ficaria nervosa. Eu estava longe do meu status quo de vida.
Eu voltei meu olhar para onde as pessoas saíam, procurando o que esperava. Já fazia em torno de uma hora que eu estava ali. E sabia que provavelmente não estava atrasada. Ou ao menos assim eu achava. Então agora era ficar olhando igual uma retardada para o portão até que eu conseguisse visualizar meu objeto de desejo. Claro, objeto no modo de falar.
Eu esperava uma pessoa.
Suspirando fundo, voltei a analisar as pessoas que saíam pelo portão quando algo naquela multidão me soa familiar. Cabelos escuros, lisos e um pouco compridos. Rebeldes e com um par de mãos conhecidas passando por eles. Meus olhos imediatamente focam na figura.
Meu coração quase para.
Minha voz some. É quase impossível respirar. E impossível de acreditar.
- Achei - Falo baixinho, minha voz me traindo.
No segundo seguinte, eu passo a correr. Independente do que as pessoas possam achar e do que qualquer um possa dizer, o mais importante é correr. Gritando palavras que só ele iria reconhecer, eu continuo minha jornada para alcançá-lo. Naquele momento, só existe ele na minha visão. Eu sinto algo descer por meu rosto mas nem me dou ao trabalho de saber o que é. Eu só continuo desviando e repetindo em uma voz trêmula, não digna de mim, "Excuse me" ou "Sorry" para as pessoas enquanto abro caminho no meio da multidão.
E como um passe de mágica, o mundo parece se abrir. Eu paro e olho para ele. Ele me encara. Por segundos, que parecem séculos. meu olhar se reconhece no dele. Nós nos achamos naquele singelo segundo. E então eu volto a correr, sabendo que os braços dele estarão ali para me abraçar.
É inevitável, quando eu me aproximo o suficiente, eu me jogo em direção a ele porque sei que ele vai me amparar. Ao sentir os braços dele em volta de mim, não há segurar. Eu me sinto em casa. E é a melhor sensação do mundo. Os braços dele são quentes e então eu me dou conta, quando ele fala, do que é que está no meu rosto.
- Por que vocês está chorando?
Lágrimas. Eu, uma pessoa que não choro tão fácil, estou me esvaindo em lágrimas. Aperto o corpo dele contra o meu em busca de amparo. Seu calor não parece real, mas eu sei que é. Ele finalmente está aqui.
- Saudades.
Levanto meu rosto para o dele e vejo seu sorriso. Eu quase não lembrava mais dele. Mesmo com as inúmeras fotos que tenho. Escondo meu rosto em seu pescoço por alguns segundos, enquanto ele sussurra em meu ouvido "Não chore, eu estou aqui".
Eu não me sentia mais sozinha.
Ele estava ao meu lado novamente. E tudo parecia certo. Não existia mais aquela dor no meu peito que eu havia descoberto ser saudades.